Um retrato de todos nós

"Jeito Felindie", coletânea-tributo ao Raça Negra, é a iniciativa certeira para um mundo cada vez mais plural


por Izadora Pimenta




Fino. Esta é a palavra correta para definir Jeito Felindie, a coletânea-tributo ao Raça Negra idealizada pelo jornalista Jorge Wagner e lançada no último dia 12 de outubro no site Fita Bruta.

Sem ironia alguma na voz, doze bandas e artistas independentes trouxeram suas próprias roupagens para clássicos que já cansamos de escutar nas rádios FM e nos videokês, como Cigana, Cheia de Manias (didididididiê) e É Tarde Demais. E tal iniciativa, portanto, deve ser celebrada: por que o Raça Negra, afinal, deve conversar com o público alternativo? Resposta fácil: porque qualquer estilo musical conversa entre si, por mais que você insista em jurar que não.

Definir a nós mesmos musicalmente: que árdua tarefa para quem se arrisca. Será que somos entusiastas da salvação do rock por meio do Strokes? Devemos lançar olhos tortos a toda e qualquer manifestação loshermânica que vemos pela frente? Quem sabe apreciar melhor o que ouve - eu nos meus fones de ouvido ou o vizinho que acorda todo o condomínio no sábado de manhã com seu micro system potente? Devo me definir? Roqueiro não é o menino de 13 anos que tem cabelo comprido e mal cuidado caindo sobre a camiseta surrada do Iron Maiden?



Somos cada vez mais pessoas plurais, existências calcadas nas experiências ao longo de nossas vidas - não importando se nossas reuniões de família comportaram Raça Negra ou o Bolero de Ravel. É por isso que a coletânea, desta forma, se mostra como um retrato fiel de todos nós. Que não criamos nada - apenas colocamos à nossa maneira o que vimos por aí. É por isso que Deus Me Livre tem a permissão para soar como uma faixa de Edifício Bambi na interpretação do hidrocor sem exalar pretensão alguma de ser melhor ou pior. "Ah, a original é melhor!". Claro que é. Mas dar espaço a outras maneiras de trabalhá-la é melhor ainda. Tão simples como seria se a Mônica resolvesse utilizar um vestido azul. Não é uma tentativa de mudança; é apenas uma vontade de fazer diferente e adaptar-se à tais vontades.

Jeito Felindie não veio para quebrar barreira alguma. Também não é inovador - essa mesma coisa da mudança já passou por roupagens mais confortáveis, como quando Cícero gravou Barely Legal para Is This Indie, do Rock 'n' Beats. Mas há de se convir que, como tudo o que busca nos oferecer além do arroz e feijão que estamos acostumados, é bastante louvável nos tempos da cagação de regra. Vão te julgar por assistir ao show do Kings of Leon na grade? Vão estranhar se você, que estampa gostar de The Cure, de repente viciar no álbum do Naldo? Quer saber: que se dane.

Escute Jeito Felindie aqui:




Confira entrevista com Jorge Wagner no Música Pavê


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