Minha História com Let It Be

Um relato particular sobre o último disco da banda que, em um momento ou outro, todos aprendemos a gostar

por Thiago Dalleck




Let It Be é um dos discos mais importantes da história da música mundial, isso todos já sabem. Foi o último disco lançado pelos Beatles e teve todo aquele espetáculo no topo do prédio da Apple e tal. Mas o que poucos sabem é a importância desse disco na minha vida.

Não sou muito velho. Nasci no início da década de 90 e cresci em meio às tantas fitas do meu pai que entoavam a trilha sonora de todas as viagens que fazíamos no velho Escort que ele dirigia. Os clássicos do meu pai não podiam faltar: iam de Bee Gees a Raul, Eric Clapton, Creedence e, claro, os Beatles.

Mas foi só recentemente que eu comecei a ouvir John, Paul, George e Ringo com mais atenção, lá em meados de 2010. Antes disso, era aquela coisa do tipo “as músicas que meu pai ouve”. Eu gostava, mas não entendia muito bem aquela paixão dele por músicas tão antigas (mas tão atuais).



Descobri em um dia, por acaso, que perdidos entre os compactos da infância das minhas irmãs, haviam alguns LPs do meu pai que nem ele lembrava que existiam. Como tenho uma vitrola aqui em casa até hoje, comecei a separar (ou melhor, a “roubar” mesmo) vários discos que queria ouvir. Até que eu achei o maior tesouro de todos: a famosa capa dividida em quatro partes do Let It Be, com o disco perfeitamente conservado dentro. De brinde, ainda achei um compacto de I Wanna Hold Your Hand / She Loves You.

Para quem começou a se encantar com uma banda que acabou há mais de 40 anos, achar um vinil do próprio pai e poder ouvir junto com ele é algo que vale mais que dinheiro. Nos primeiros contatos da agulha com o disco, ainda hoje é arrepiante ouvir a introdução de Two of Us (“I dig a pigmy by Charles Hawtrey...”), além de Across The Universe, I’ve Got a Feeling, Get Back e todas as outras. Ver meu pai feliz em poder compartilhar nosso presente com o passado dele era incrível.

Ele achava ser o George em I Me Mine, encarnava o maior roqueiro em I’ve Got a Feeling e não largava sua air guitar em Get Back. Ele se divertia e eu também. Na música Let It Be, no entanto, ele ficava mais discreto e introspectivo, com o olhar vago. Era como se estivesse voltando no tempo para uma época que passou há décadas, mas que parecia ter ficado incompleta e que precisava de um ponto final.

Meu pai faleceu aos 57 anos, de câncer, em junho de 2011. Nos seus últimos dias de vida, já em coma na UTI, Let It Be (deixe estar) era a música que eu cantava pra ele enquanto segurava sua mão. Meu olhar era vago como o dele quando ouvia essa música; talvez eu quisesse voltar no tempo como meu pai gostava de fazer.

Hoje, tudo o que tenho é esse disco (e uma pequena coleção de vinis), uma tatuagem com um trecho da partitura de Let It Be em homenagem a ele e lembranças, muitas lembranças boas.



11 comentários:

  1. por causa de toda essa história, é meu disco preferido dos Beatles (empatado com Sgt. Peppers)

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  2. Whisper words of wisdom - talvez esse fosse o melhor título para o seu texto.

    Você sempre é muito sábio com as palavras e mesmo sendo, as vezes, um cara meio enigmático, consegue com os seus textos, revelar mais sobre você.

    A música é linda (claro, Beatles) e o texto escrito por você é envolvente. Já disse antes e volto a repetir. Seu pai devia ser um cara incrível e conseguiu criar filhos com as mesmas características.

    Afinal, já dizia Cecília Meireles:

    "De que são feitos os dias?
    - De pequenos desejos,
    vagarosas saudades,
    silenciosas lembranças."

    Parabéns!

    Um abraço

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  3. Que lindo Thiago, essas lembranças vão ficar pra sempre né?! Adorei conhecer essa sua história, e let it be ;)

    Beijos!

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  4. There will be an answer, let it be.
    Linda história, Dalleck. Beijos.

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  5. Acho lindo que a música tenha feito o seu papel..emocionar e guardar momentos únicos. Baita história a sua ;)

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  6. Amei o post! Fiquei até emocionada!

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  7. Arrancou umas lágrimas.

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  8. Me emocionei com a história também. Essa música é de uma instrospecção bastante intensa pra mim, também. Dá uma sensação nostálgica - me lembra os meus avós, já que todos eles já se foram.

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  9. Que lindo e emocionante. Linda musica, linda história.

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